Para quem gosta de aproveitar os dias de descanso para explorar novos ares, Jundiaí é uma opção. Com quase meio milhão de habitantes, a cidade paulista concilia o encantamento do interior com as comodidades do dia a dia urbano. Em suas ruas e alamedas arborizadas, pulsa a vida em ritmo frenético, acompanhada por bucólicas paisagens e pela Serra do Japi, patrimônio natural da humanidade.
Jundiaí fica a cerca de uma hora da capital de São Paulo – pouco mais de 50 quilômetros separam as duas cidades. Oferece hotéis, flats, shopping centers, bares, restaurantes e baladas para os mais exigentes gostos, além de ser famosa pela produção de frutas e vinicultura – promove um dos mais antigos eventos do interior do estado: a Festa da Uva, cuja primeira edição aconteceu em 1934, reunindo mais de cem mil visitantes.
Tradições da Itália
Em sua área rural, é possível vivenciar experiências inesquecíveis. Quer conhecer um pouco da história de sua colonização? Faça a Rota da Cultura Italiana, um dos oito roteiros turísticos oferecidos na cidade. Acolhedora de centenas de famílias do Vêneto e do Trento Tirol, no norte da Itália, a partir do final do século 19, Jundiaí ainda agora preserva intactas e autênticas tradições da Itália.
Hoje, mais de 75% da população de Jundiaí é descendente de imigrantes italianos, constituindo-se em uma das maiores colônias em todo o Brasil. E são nas ruas de bairros como Colônia, Caxambu e Traviú que muitas dessas famílias moram e transmitem aos filhos a cultura e os costumes trazidos pelos avós e bisavós, “mantendo viva” a alma Itália.
Massas para todos os gostos
Você é aficionado por massas? Em Traviú, no Tre Sorelle – Pasta Fatta in Casa, além de poder comprar, é possível agendar e aprender a fazer uma ou várias delas. Passado de pai para filho, o pastifício de tradição italiana há 21 anos produz massas levemente sovadas, laminadas em cilindros e feitas com produtos in natura – para colorir usa vegetais como a beterraba e a cenoura, ervas aromáticas, vinho e Nero de Sépia (tinta de polvo).
O resultado do caprichado processo de produção surge em fettuccines, talharins, linguinis, papardellis e espaguetes de sabor e de leveza inigualáveis que a casa comercializa não só em sua lojinha para os visitantes, mas também para vários restaurantes da cidade. Ao todo, são 12 diferentes tipos de massa, além de molhos artesanais (ao sugo e pesto) e pães recheados.
A casa é comandada por Maria Elisa Rizetto Gallo, que aprendeu a fazer as pastas, os molhos e os pães com a mamma – é claro! Maria Elisa também ensina grupos interessados em produzir a sua própria massa. Paralela à aula, os participantes se enternecem ao ouvir a história e as curiosidades da antiga fazenda de 1893, comprada por cinco famílias italianas e mais tarde transformada em bairro.
Enquanto ensina a fazer a massa, a chef conta sobre as rivalidades que existiam entre vênetos e tiroleses que ali moravam, sobre Nossa Senhora das Vitórias, sobre a antiga capelinha dedicada à santa e transformada em 1959 em um grêmio, hoje um espaço cultural com palco, auditório e equipamentos de som e cinema… São capítulos da história deliciosos de ouvir e de aprender.
Mangia che te fa bene!
Traviú é dono de uma bucólica paisagem, repleta de árvores, construções que exibem a arquitetura de séculos passados e de casas com jardins floridos. Abriga ainda dezenas de restaurantes e vinícolas – afinal, Jundiaí é a terra da uva e do vinho, outro precioso tesouro trazido na bagagem dos imigrantes italianos.
Foi neste italiano bairro que “nasceu” a uva niágara rosada. Ela foi descoberta em 1933, quando no meio de uma cepa de niágara branca do vinhedo de Antônio Carbonari surgiram cachos de uvas vermelhas resultantes de uma mutação somática espontânea. Na época, Traviú estava ligado a Louveira, onde ocorreu o fenômeno, e ambos pertenciam a Jundiaí. Atualmente, Louveira é uma cidade independente.
Rapidamente, a niágara rosada começou a ser cultivada e conquistou o paladar dos consumidores, substituindo as demais variedades produzidas até então, sobretudo as uvas isabel e corbina. Hoje, Traviú concentra muitos produtores de uva niágara rosada – pelo bairro espalham-se mais de 50 pequenas propriedades rurais que cultivam essa espécie da fruta, reconhecida oficialmente como patrimônio imaterial da cidade.
Espaços gastronômicos
Além das propriedades rurais que vendem frutas da melhor qualidade e onde é possível saboreá-las diretamente do pé (Jundiaí faz parte do Circuito das Frutas paulista) e da Adega Santa Cecília, produtora de vinho artesanal, o bairro italiano abriga espaços gastronômicos charmosos e repletos de tentações irresistíveis.
Quer degustar um café da manhã com gostinho da casa da fazenda da vovó? Acorde cedo, principalmente se sente fome logo que desperta, e vá até o Bella Mattina – às 8 horas a fila, incluindo a do estacionamento, é enorme. Se gosta de dormir até mais tarde, a casa atende até às 13 horas, quando as filas continuam, mas pouco menores.
Abraçado pelo verde, o amplo e arejado espaço oferece um bufê com a mais completa variedade de sucos, pães caseiros, geleias, doces, tortas e salgados – tudo que você conseguir imaginar tem lá. Inaugurado em 2016, a casa pertence a Bruno Thomazetto. Tem capacidade para 200 pessoas e, além do café colonial, oferece passeio de jipe pela propriedade. Possui ainda um pequeno empório, playground e adega.
Lembrança da comida da nonna
Coladinho ao Bella Mattina está o Travitália Bar & Restaurante, espaço onde a memória afetiva da infância e a lembrança da comida da nonna são fortemente despertadas. O nome da casa surgiu da união das palavras Itália e Traviú, bairro onde o estabelecimento está situado e onde a cultura dos italianos mescla-se com a dos moradores locais.
Instalado em um sítio com jardins floridos e playground, a casa incorpora em seu menu os aromas e sabores da Itália – os italianos, quando aqui chegaram, não ficavam um dia sem comer polenta, um dos pratos mais tradicionais de seu país. Também neste restaurante a polenta é uma das principais estrelas.
No cardápio do Travitália, a polenta surge em diferentes versões: na entrada, com a porção de Polenguiça frita, tiras de polenta com linguiça caseira e cheiro verde. E ainda, com o Polenta Monte Traviú, prato principal no qual a polenta recheada com muçarela é coberta com molho de calabresa defumada e costelinha de porco desfiada.
Com varanda que oferece vista memorável da natureza, com seus tons de verde, plantações e flores, o restaurante tem nas massas e molhos caseiros outro de seus pontos fortes, mas também oferece variadas opções de petiscos, saladas, risotos, panquecas, carnes e peixes, além de pratos executivos. Também aqui a fila de espera é grande.
Muito além do Traviú
Jundiaí não se resume ao centenário bairro italiano da cidade. Sua área rural guarda ainda muitas outras preciosidades. Na Quinta Dos Alves, um sítio cercado por bambuzais e banhado por um riozinho, o café da manhã tem deleites como pães caseiros, sucos naturais, tortas, bolos, tapioca, doces e geleias, entre tantas outras delícias.
O Sítio São José – atual Quinta Dos Alves – foi adquirido por José Alves, um imigrante português que chegou ao Brasil no século 19. A propriedade de dez hectares foi transmitida de pai para filho, e hoje pertence aos irmãos Luciana, Francisco e Denise Alves. Além do café matinal, a casa tem minifazenda, parquinho, loja e estacionamento. Se for até lá, não deixe de conhecer a árvore de pau-brasil, plantada por Luciana décadas atrás.
Pela área rural de Jundiaí espalham-se dezenas de produtores de vinho artesanal. Vale a pena agendar uma visita em um ou em vários deles para conhecer o processo de produção da bebida e os seus diferentes aromas, notas e cores – muitas adegas também possuem restaurantes, caso da adega Beraldo di Cale e da Adega Fontebasso.
Beraldo di Cale
Localizada no bairro de Caxambu, a primeira tem restaurante com mesas espalhadas ao ar livre em arborizado espaço do sítio. A propriedade foi adquirida em 1927 pelo imigrante italiano Beraldo Paulini para produzir café e, posteriormente, a uva niágara. Nos primeiros anos de cultivo, a fruta era vendida in natura, mas, anos depois, com o excedente da produção, começou a ser usada para a confecção de vinhos.
A adega foi fundada em 2001, sendo batizada de Beraldo di Cale em homenagem ao italiano nascido em Cittaducale, na Itália. Hoje, a quarta geração da família conduz a propriedade e os negócios, tendo à frente Solange Paulini. Além da homenagem ao nome dos vinhos, a casa tem no cardápio a mais genuína expressão culinária da Itália, com destaque para as massas com molhos artesanais, porpetas de carne e polentas.
Restaurante Sítio Fontebasso
Ainda em Caxambu, o Restaurante Sítio Fontebasso é outra autêntica tradução da Itália, tanto na mesa como na produção artesanal de vinhos. Comum aos italianos, o exagero aqui surge nos pratos da casa – a lasanha borbulhando de quente e repleta de muçarela serve pelo menos quatro pessoas com muita, mas com muita, fome mesmo.
Se você não é muito comilão, não peça esse prato. Ele é exageradamente bem servido e acabará sendo desperdiçado. Ou melhor, antes de pedir qualquer outra opção do cardápio, certifique-se de que ela será suficiente para saciar sua fome – todos os itens servidos na casa, incluindo as saladas, são extremamente “generosos”.
Quanto à produção de vinhos, ela é bem mais tímida. Começou em 1887 com a chegada ao Brasil de Santo Fontebasso, italiano que veio trabalhar como carpinteiro e fazer reformas em casas de uma fazenda de café. Juntou dinheiro e, com os anos, comprou um pedaço de terra. Nela, tinha criação de animais e praticava a agricultura para a subsistência da família.
Cinco anos após a compra da terra, o imigrante, pai de 15 filhos, produziu o primeiro vinho e achou que estava rico. Não ficou, mas a produção da bebida não parou até hoje. Foi herdada e hoje é conduzida por Rodney Fontebasso, assim como as visitas de grupos com direito à degustação – têm de ser agendadas. Os vinhos que a propriedade produz podem ser comprados na loja do restaurante, que é comandado por Vítor Fontebasso.
Cin, cin, salute!
No bairro de Champirra, a adega Oliveira é comandada pelo engenheiro Ivan Lúcio de Oliveira. A propriedade herdada por ele e seu irmão foi comprada pelo avô, um imigrante português, em 1922. Foi usada para o cultivo de algodão até 1929, quando a Grande Depressão fez a família passar a investir na produção de uva e vinho.
Transformada em paixão, a bebida seduziu o engenheiro ainda menino: ele tinha 12 anos quando produziu seu primeiro vinho branco, em 1984. A partir daí, não parou mais. Em 2007, abriu a adega onde espumantes e diferentes tipos de vinhos produzidos na propriedade são comercializados. Ivan Lúcio compartilha essas e outras saborosas histórias em visitas agendadas.
Vinícola Castanho
Também a premiadíssima vinícola Castanho é movida pela paixão ao vinho, uma paixão transmitida de pai para filho que persiste até hoje. Situada em outra rota turística oferecida na cidade, na Rota do Castanho, a empresa “nasceu” em 1968, quando a propriedade foi comprada por Aristides Lemes da Silva.
Inicialmente, os vinhos não eram vendidos na fazenda, mas a qualidade e o carinho no cultivo das uvas e na produção de vinho fizeram a bebida ganhar fama, aumentando a procura. Assim, foi inaugurada a loja da propriedade, onde hoje é possível provar os diferentes tipos da bebida antes de escolher qual delas vai comprar.
O cuidado criterioso com a produção do vinho resultou no desenvolvimento e no lançamento de novos produtos, muitos deles premiados – todo o processo de produção do vinho da vinícola e do vinhedo respeita o meio ambiente, incluindo a preservação das reservas de água, a não utilização de irrigação, a cobertura com grama do solo e o descarte das garrafas.
Atualmente, a vinícola é administrada pelos filhos de seu Aristides. Oferece o Tour do Vinho, um passeio pelo vinhedo e pela vinícola, com direito a caminhada pelos parreirais, informações sobre os processos de poda, colheita, vinificação e de envelhecimento dos vinhos, além de degustação de vinhos e espumantes.
Na cidade
Para quem vai ficar um pouquinho mais em Jundiaí, uma dica é visitar o Museu Ferroviário. Instalado no Espaço Expressa, um belíssimo complexo do final do século 19 construído para ser as oficinas da Cia. Paulista de Estradas de Ferro, o museu foi reaberto em 2022 após o lugar ser restaurado. Hoje, é um centro cultural tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
Nas duas salas do museu, é possível viajar pelo tempo e conhecer melhor a história das ferrovias, dos trabalhadores que as construíram e a sua importância para o transporte. Ali também estão um balcão de vendas de passagens, malas e bagagens, móveis das antigas estações e miniaturas de locomotivas a vapor, além de uma maquete em funcionamento.
O acervo do museu reúne ainda relógios e cadeiras de madeira da sala de espera de antigas estações, máquinas de escrever e fotográficas, documentos, fotos e jornais descrevendo os diferentes períodos históricos e acontecimentos ligados à ferrovia, fazendo ainda uma homenagem às contribuições das ferrovias e dos ferroviários.
Kiosque Roseira
Outra boa pedida é ir ao Kiosque Roseira, onde é possível provar uma criativa coxinha – a recheada com muçarela foi a vencedora por três vezes de um concurso da melhor coxinha de queijo da cidade. Crocante e sequinha, o salgadinho tem um diferencial: sua massa é de mandioca, e não de batata como tradicionalmente a coxinha é feita.
Entre as dezenas de versões doces, salgadas e veganas que o espaço oferece, destaque para a de uva. Essa coxinha doce é preparada com a massa de mandioca e suco de uva integral e recheada com geleia de uva. Foi lançada na 37ª Festa da Uva e 8ª Expo Vinhos de Jundiaí em 2020 e é surpreendente!
Aberta pelo casal Laurinda e Jayr Leonardi em 1987, a barraca de frutas posteriormente foi reformada e passou a ser de alvenaria, vendendo sucos, pastéis e coxinhas com massa de mandioca. Hoje é comandada pela filha do casal, Mônica Leonardi Schincariol, e seu sobrinho César Leonardi Oliveira. A empresa tem outra unidade na avenida Jundiaí, 553, Anhangabaú, e um foodtruck na avenida Eloy Chaves, 121, Ponte São João.
Por Fabíola Musarra – revista Qual Viagem
Fonte: Jovem Pan Read More